terça-feira, 9 de setembro de 2014

Aposentando a espada

APOSENTANDO A ESPADA
*MMendes
Vou dormir
 mas não 
sem antes 
pedir perdão 
aos homens 
e mulheres 
que magoei 
com meu poder. 
Mas nada fiz 
com dolo 
ou satisfação 
em ferir. 
Procurei ser justo, 
mas não esqueço 
que a justiça 
dá a cada um 
o que é seu, 
cortando 
com sua 
espada. 
Um dia 
aposentarei 
a espada, 
cultivarei 
flores 
plantarei árvores.

Presente do tempo

PRESENTE DO TEMPO

*MMendes
O tempo passou 
depressa. 
Mas acho que 
eu é que andei 
distraído demais, 
desatento 
aos sinais. 
Como é que 
não percebi 
o surgimento dos 
cabelos alvejados, 
das rugas 
de expressão, 
o tecido flácido? 
Pensando melhor, 
eu ganhei 
tudo isso 
como prêmio 
por ter vivido, 
coisa que 
quem morre 
cedo 
verá jamais.

Pedaços de mim

PEDAÇOS DE MIM
*MMendes
No instante que eu me arroguei
belo luzeiro no mais alto do céu
nesse instante eu cai
me quebrei 
de mim me separei,
filho ali, mãe acolá
o pai nem sei onde foi parar.
Eu não devia ter subido tão alto
não sabia voar.
Depois de me perder de mim
eu que era apenas cacos
precisava de alguém
que me pudesse ajuntar,
soubesse onde me encaixo
me resgatasse do chão
para que eu 
me recebesse de volta.
Então voltei para casa
voltei para o que sou
um igual
nem maior, nem menor
abracei-me com amor
nunca mais vou me deixar.

O coração do poeta


O CORAÇÃO DO POETA
*MMendes

Quanta poesia 
há na alma 
de um poeta? 
Três sonetos, 
uma quarta, 
cinco trovas 
versos sem fim?
Na ponta 
do lápis 
e da língua 
a poesia 
transborda, 
mas é 
no coração 
do poeta, 
que a poesia 
nunca dorme.

domingo, 31 de agosto de 2014

Pássaros no quintal

PÁSSAROS NO QUINTAL
*MMendes
Assobiava seu dobrado
gorjeando em seu altar 
na árvore, perto do sobrado
alaranjado sabiá,
enquanto canários 
disfarçados entre pardais,
trinavam sem parar.
Do briguento bem-te-vi
ninguém podia se aproximar.

quarta-feira, 13 de agosto de 2014

Olhos para luz



OLHOS PARA LUZ

Oh meu Jesus de Pirapora, 
se sabemos 
que a morte é inexorável, 
de onde vem 
o desejo ardente de viver 
que em nossa alma vigora? 
Se cerrar os olhos 
no breu da noite fúnebre 
é tão natural 
por que persistimos 
em contemplar 
o assomar da aurora? 
É que a morte é terrena 
e a vida é divina, 
oh Madalena. 
Os olhos se abrem a luz 
enquanto a alma imorredoura 
que com a vida pactua
sua força revigora.

segunda-feira, 11 de agosto de 2014

Partida

PARTIDA
*MMendes

Meu amor
parti sem me despedir
é que eu não sabia
que hoje seria o dia
que Deus me levaria.
Ouvi você pedir que eu não o deixasse.
Não dei o beijo da despedida
nem o abraço da saudade.
Não é que eu não queria
apenas não tive tempo. 
Meu amor
a vida quis assim
o meu amor em ti
o teu amor em mim.
Na hora em que parti eu entendi
que era nosso coração
quem se partia.
Mas não fique triste
o amor é mais forte que a morte
e não há nada que nos separe

O movimento do tempo



O MOVIMENTO DO TEMPO
*MMendes
Primeira versão:

O tempo é sorrateiro. 
Mudei sem perceber. 
A altura, 
o rosto, 
o corpo, 
o cabelo, 
as marcas de expressão, 
a miopia. 
Quando notei 
eu era outra pessoa. 


Segunda versão:

O tempo é sorrateiro. 
Mudei sem perceber. 
A altura, 
o rosto, 
o corpo, 
o cabelo, 
as marcas de expressão, 
a miopia. 
Quando olhei no espelho
me assustei:
- Quem é esse ai?

Terminar onde comecei

TERMINAR ONDE COMECEI
*MMendes


Antes de tudo 
eu não era nada. 
Fui bruma 
que se tornou espuma, 
sussurro de amante, 
multiplicação febril. 
Fui movimento 
incontrolável, 
células desesperadas 
em querer ser alguém, 
criar olhos para ver, 
ouvidos para ouvir, 
mãos para agarrar, 
pernas e pés 
para fazer 
meu próprio caminho.
Fui gerado, 
tive fome, 
tive frio, 
tive medo, 
fui amado, 
abraçado 
amei.
Fui filho, 
nas asas do tempo
voei. 
Me apaixonei.
Me tornei homem, 
marido, pai, 
trabalhei, 
suei, sofri, corri . 
Caminho ao encontro 
do céu e da terra, 
miragem da estrada
ainda não cheguei.
Sou movimento 
desacelerado, 
células esperançosas 
em ser alguém, 
tomar meus sonhos,
firmar as pernas
no destino
de ser findo,
espuma,
tornar a ser bruma
terminar onde comecei.

domingo, 3 de agosto de 2014

Crer ou não crer

CRER OU NÃO CRER

Crer ou não crer 
eis a questão da verdade.
Sou eu a própria realidade.
E que realidade eu sou?
Sou aquilo que quiser
Se o tempo permitir
Se souber para onde vou.

terça-feira, 24 de junho de 2014

As cores do tempo

AS CORES DO TEMPO

O futuro é colorido
pelo tempo 
Alvejado.
Por isso
que o passado
é preto e branco, 
na melhor sorte 
desbotado.

segunda-feira, 26 de maio de 2014

Sabor de amizade

SABOR DE AMIZADE

A vizinha 
bateu à porta 
para aconchegar-se.
Friozinho de outono 
tarde perfeita.

Quando o aroma 
de café 
se espalhou 
pela cozinha, 
descobri 
que amizade 
tem sabor 
de bolachas 
quentinhas.

domingo, 25 de maio de 2014

Frase incompleta

FRASE INCOMPLETA

Não sabia o que falar, 
nem o que fazer. 
O que era aquilo? 
À interrogação 
me entreguei. 
Rasguei o verbo,
joguei diretas
e indiretas,
perdi o objeto.
Sou um pobre sujeito 
sem predicado.
Não tenho adjetivo.
Preciso muito de oração...

Sintática.

A que ponto cheguei!

sábado, 24 de maio de 2014

O ciclo da vida

O CICLO DA VIDA

O dia se foi 
a noite chega fria. 
O céu chora, 
de tristeza ou alegria?
O tempo folheia 
o livro da vida 
enquanto o coração 
se enche de nostalgia. 
É bom saber que amanhã 
será outro dia.

quinta-feira, 22 de maio de 2014

Dúvida

DÚVIDA
*MMendes
Minha luz, 
onde estás? 
Meu caminho, 
para onde vou? 
Minha vida, 
onde estou? 
Minha verdade, 
o que sou?

domingo, 11 de maio de 2014

Batidas do coração

BATIDAS DO CORAÇÃO

Mulher, 
morei nove meses 
dentro de ti, 
o som 
das batidas 
do teu coração, 
foi o primeiro som 
que eu ouvi.

Teu colo 
foi o abrigo 
que me acolheu 
quando eu descobri 
o sofrimento 
que é viver. 

Recostado 
no teu peito 
eu reconheci 
as batidas 
do teu coração. 
Então me acalmei. 

Hoje 
me lembro 
tanto de ti
quando faço 
silêncio profundo
e ouço 
só as batidas 
do meu próprio 
coração. 

Ai então, 
me dá 
uma saudade 
louca de te ver.

Então fecho 
os olhos 
na escuridão 
do cinema 
da minha mente, 
as luzes 
se acendem 
projetando tua imagem, 
que eu 
tanto abraço, 
beijo, 
prometo 
te amar sempre 
nunca, 
mas nunca mesmo,
te esquecer.

sexta-feira, 2 de maio de 2014

As férias


AS FÉRIAS
* MMendes

Arrumava as coisas ansioso, amanhã estará de férias. Merecidas férias, vindas em boa hora. O cansaço pelo trabalho já não era mais só um cansaço. Já demonstrava alterações na saúde como tonturas e dores cervicais. Todo ano era assim, início das férias, período de recuperação a saúde. 

Algumas pessoas com quem se relacionava no trabalho perguntaram em tom de ironia: 

- Vai sair de férias de novo? 

Outro funcionário perguntou: 

Quando é que o senhor vai sair de férias mesmo? Perguntavam assim porque dependiam de seus pareceres para executarem seus trabalhos e as férias daquele homem dificultava o trabalho deles. 

O homem respondeu: 

- Saio de férias amanhã! 

- Que tenha ótimas férias. Desejou o funcionário.

O diretor daquele deu seu parecer:

- Penso que essas férias vieram em boa hora. Não é mesmo? O senhor está com o semblante cansado. 

E o homem sempre comentava com quem lhe perguntava das férias:

- Tiro férias do trabalho, mas não férias dos problemas. Quando eu saio de férias do trabalho, levo a vida comigo e todos os meus problemas vão juntos. Eu preciso também tirar férias dos problemas, mas eles não me dão trégua.

- O senhor vai viajar? As pessoas pensavam que aquele homem ganhava muito e que saindo de férias iria para o exterior ou fazer a viagem dos sonhos. Dos sonhos de quem perguntava. Mas a viagem do homem era para bem mais perto.

Enfim, chegou o festejado primeiro dia de férias. Fez as malas, ligou o carro e foi para casa. O homem trabalhava numa cidade distante 220 km de sua residência. Ia para casa só aos finais de semana. Nos dias normais trabalhava em jornada diária de até 13 ou 14 horas, muitas vezes com 20 ou 30 minutos para o almoço, tão somente. Estava de férias, ficaria os 30 dias em casa.

Esse homem trabalhava como mediador de conflitos e realizava umas dez audiências por dia ouvindo pessoas relatando seus problemas,o quanto sofrem, o quando são injustiçadas. Essas pessoas não conseguiam resolver seus problemas e assim os levavam para aquele homem, que era pago para resolver problemas. Há vinte anos estava nessa profissão e testemunhou pessoas sofrendo por avareza, por ingratidão, por vingança, por descaso e abandono, por falta de cultura, por falta de esclarecimento, por falta de informação, por desamor, vítimas de agressão, da imprudência, negligência, atitudes essas que causavam sofrimento com danos econômicos, psicológicos, estéticos decorrentes de cortes e mutilações de membros,  familiares, profissionais, fomentando conflitos que se potencializavam pela agressividade e desrespeito com que se tratavam. 

Fez a viagem de volta do trabalho para casa. Mas era sempre assim. Quando chegava em casa o trabalho da casa e o que os filhos davam, não estavam de férias. As pessoas da casa também estavam cansadas do dia a dia. Quando o homem chegava sempre passavam para ele um pouco de atribuições. Afinal, se estava na casa tinha que dividir as tarefas. Então ele ajudava a mulher a arrumar a casa, lavar louça, fazia pequenos consertos, resolvia os problemas que a mulher não podia ou não sabia resolver e ainda resolvia os conflitos domésticos. Quem não os tem? Afinal ele era um “resolvedor” de problemas, por que não resolver seus próprios problemas? Resolver os próprios problemas é mais difícil. Dentro dos problemas ficamos cegos para a solução. A porta de saída do problema está ali à frente, mas resistimos em abrí-la. Abrir portas exige renúncia de si mesmo, eis a dificuldade. 

Ficava tanto tempo fora de casa que era mais um estranho em casa do que um membro da família. Quando entrava de férias e passava a participar assiduamente da vida familiar, na primeira quinzena de férias havia muitos conflitos de percepções e opiniões sobre a rotina da casa. Quando expressava sua opinião diziam:
- Você é um chato. Vem de férias e só sabe reclamar de tudo. Fechavam a cara e pronto.

Se dissesse que estava precisando de férias diziam que ele não gostava da família. A esposa não trabalhava fora e cuidava apenas dos afazeres domésticos. Por isso sempre respondia ao marido|:

- Eu não tenho direito de férias. 

E, assim, o homem passava os dias no gozo das merecidas. No último dia de férias as pessoas da família perguntavam:

- Você já vai voltar para o trabalho? A mulher dizia.

- Como passou rápido! Preciso ver como vou fazer sem sua ajuda. Acho que preciso contratar uma empregada. Estou velha para o serviço doméstico, não consigo fazer tudo sozinha.

A mulher e os filhos nunca haviam ido até a cidade onde ele trabalhava. A alimentavam o pensamento de que lá ele era poderoso, todos lhe obedeciam e faziam suas vontades mesmo antes de pedir. Que tinha a vida que pediu a Deus.

Ao contrário de algumas pessoas do trabalho, na família ninguém lhe desejava bom trabalho. Embora lá no trabalho, no fundo, no fundo, não quisessem realmente que ele saísse de férias  porque dependiam dele para executarem suas próprias tarefas. Às vezes parecia um alívio voltar para o trabalho.

Quando retornava ao trabalho, ao chegar em sua sala de ofício, lá estava uma pilha de documentos e problemas acumulados para resolver para o dia seguinte. E ai dele se não desse conta!

quarta-feira, 30 de abril de 2014

O muro da caveira



O MURO DA CAVEIRA
*MMendes


Deserto escaldante, nenhum sinal de vida ao derredor a quilômetros de distância. Mas, a vida estava lá, oculta, resistindo ao calor. Cobras e lagartos se escondiam sob a areia cálida, buscando conservar a escassa umidade. Nenhuma sombra. Os ventos contra-alísios dissipavam as escassas nuvens. A areia fervia como inferno e rangia seca calcada pelos pés do andarilho, que não tinha um lugar sequer para descansar. Aquele lugar de pedras corroídas e dunas que serpenteavam com o vento, também era o local ideal para a preservação dos corpos mumificados pela aridez.

Na desolação daquela dura caminhada lembrou-se de um sonho de infância. Caminhava  no meio da floresta por uma trilha com outras crianças entoando hinos, até deparar-se com uma muralha de pedra, onde havia uma toalha estendida, cujas manchas de sangue imprimiam um rosto. Ajoelhou-se diante dela prometendo ser fiel a Deus até os confins do universo. Aquela lembrança caiu como um oásis e refrescou sua alma naquele momento.

Passo a passo, nada no horizonte. Apenas calor candente de sol abrasador. O brilho de seus olhos ciano distinguia-se do azul celeste, tão somente para garantir que aquela paisagem aterradora não o incorporasse definitivamente de corpo e alma, sob sete palmos de areia.

Quando seu olhar se desprendeu da memória fixando-se na realidade, viu logo ali à frente uma imensa muralha que dividia o mundo ao meio, de norte a sul, da terra ao céu. Era impossível continuar. Reparou que havia alguém sentado em frente à única porta que havia naquele paredão. Aproximou para pedir passagem. Não era um homem, mas sim uma criatura sobrenatural. Estava sentada no último degrau de uma escada de três degraus. Atrás dele, ao invés de uma porta, um arco de crânios humanos presos na parede desenhando um portal. Mas não havia passagem. A criatura de hábito talar vestia-se com um tecido rude, revelando pobreza, desapego e humildade. Tinha a cabeça coberta por um capuz e a cintura cingida por uma corda de sisal. Era com certeza uma caveira, uma caveira viva. Podia-se ver a ossada de seus pés descarnados entre cobertos pelo hábito e os ossos dos punhos das mãos, que se escondiam dentro das longas mangas da vestimenta.

O andarilho pensou: “Estou cara a cara com o julgador dos homens, aquele que venceu a morte e ressuscitou dos mortos. O guardião da porta do céu e da terra”.

Os crânios do portal sugeriam que ninguém passaria vivo para além dali. Apenas Ele que venceu a morte e conheceu os dois lados, aquele que viu face a face o rosto de Deus. O muro era o fim da trilha, o fim da vida. Do outro lado a promessa do recomeço, de uma nova vida.

- Pelo amor de Deus, me deixe passar. Tenho sede, tenho fome, meus pés estão em frangalhos. Meu couro está castigado pelo calor e pela aridez desse deserto. Suplicou o andarilho.

- Você foi o número três, depois foi o número seis. Agora você é o número sete. Disse a criatura imóvel diante do andarilho.

Aquele que andava como caça fugitiva a esconder-se da morte, recordou de um segundo sonho em que havia sido perseguido pelo demônio. Estava com seis amigos numa casa com vários cômodos. O ar da casa era esfumaçado e peças de ouro dispersas pelo chão. O diabo estava lá, sequestrando um a um seus amigos. Sabia que eram seis amigos, mas de fato não viu nenhum. Talvez fosse ele próprio todos sete. Rezava para que não chegasse sua hora. Todos os amigos sumiram e estava só com o terror. Pedia a Deus proteção, até que abriu uma porta e deparou-se com o coisa ruim sentado numa cama de casal. Seu corpo cintilava como ouro polido, sua face derretia-se como plástico inflamado, adornado por quatro chifres que fagulhavam. Acordou na hora “H”, como que arrebatado do inferno, salvo pela providência divina que o despertou.

Nesse momento o andarilho reparou que a criatura segurava um cajado que tinha no alto uma serpente dourada. Mais curioso ainda é que não deixava sombra. Naquele deserto sua alma congelou de medo. Afinal, aquela criatura era o Filho de Deus ou o satanás, o anjo decaído? Qual seria enfim sua sorte?

Nesse momento a criatura se levantou e baixou seu capuz, revelando um crânio de cristal, através do qual a luz do sol do deserto penetrava, criando um efeito multicolorido de efeitos prismáticos. Todo iluminado, o crânio parecia pegar fogo, fazendo com que os orifícios dos olhos se tornassem muito brilhantes, criando um fluxo magnético através dos olhos, que abriram uma porta psíquica para uma região desconhecida do cérebro, uma porta para a verdade absoluta, que conectava a criatura ao viajante.

O fluxo do tempo ia e voltava como ondas do mar. O passado e o futuro se misturavam escrevendo e reescrevendo a história, como se as mesmas letras de um livro pudessem ser embaralhadas num arranjo matricial, escrevendo o passado e, “mutatis mutantis”, noutro arranjo escrevendo o futuro. Múltiplas realidades, múltiplos desfechos, histórias que podem ser contadas de várias formas, sem começo nem fim. Uma nova realidade abria-se diante de seus olhos e, uma infinidade de dúvidas e passagens bíblicas transitavam por sua mente.

Seria aquela criatura o Lúcifer, a estrela da manhã, a filha da alva que foi precipitada do céu, cortado por terra, acusado de debilitar as nações (Isaías 14:12)? Seria ele a serpente que ofereceu o fruto do conhecimento e abriu os olhos dos homens para o bem e para o mal?

Ou, ao contrário, seria Jesus apocalíptico que se intitula a resplandecente estrela da manhã, a raiz e a geração de Davi (Apocalípse 22:16)? E aquela serpente dourada sobre seu cajado? Seria a serpente que ofereceu o fruto do conhecimento a Eva? Ou, seria a serpente de metal construída por Moisés, a mando do próprio Deus, colocada sobre um poste para curar os que haviam sido picados por serpentes no deserto (Números 21:8), com o qual Jesus se equiparou (João 3:14-15)?

Seria possível que Lúcifer e Jesus fossem uma única pessoa? O início e o fim, o alfa e o ômega do ciclo de libertação e salvação do homem? Jesus seria Lúcifer regenerado, o filho pródigo que retornou para redimir-se pregado na cruz? Por ter ofertado o fruto do conhecimento, teria ficado responsável por dar também o fruto da vida eterna, sua carne e seu sangue, a hóstia sagrada? Afinal, somos responsáveis por aquilo que cativamos!

E o fato da criatura não possuir sombra? Seria um espectro? Ora, Jesus ressuscitado não é espectro (Lc 24:39)!

Então a criatura disse:

- Libertação não é livre arbítrio. O livre arbítrio é a capacidade de optar pelo bem ou pelo mal. Mas, só é livre aquele que sabe libertar a si e aos outros, de modo que ninguém escravize, explore ou destrua o outro. A liberdade é a escolha livre do amor e é a escolha pelo amor que leva à salvação.

Nesse instante o homem caiu por terra aos prantos. Aquele ser contraditório parecia conciliar o inconciliável, Deus e o demônio. Brotou naquele momento, a consciência de que o maior propósito de Deus é a reconciliação com todas as criaturas. Dar dignidade de filho de Deus a toda a criatura. Tinha que reaprender amar. Suas lágrimas eram absorvidas pela areia do deserto. A criatura postava-se em pé ao seu lado. Estendo sua mão de caveira, ordenou ao homem:

- Levanta-te, pois Deus te criou para viver. O deserto em que andas está dentro de tua alma, castigada pela dureza de teu coração preconceituoso e condenatório. A única coisa que religa o homem a Deus é o amor e o perdão. Não julgues para não serdes julgado. Não condenes para não serdes condenado. A justiça e paz são os frutos do amor. O perdão é a única coisa capaz de nos livrar do mal e do pecado.

- Se queres a vida eterna vá e caminhe até o portal da vida e da morte. Se teu coração for leve como uma pluma, tiveres amado a vida que recebestes gratuitamente de Deus com todo teu espírito, todo teu entendimento, todo teu coração, então passarás pela porta incólume. Caso contrário, morrerás para sempre.

- Se não estiveres preparado é melhor voltares a caminhar pelo deserto por mais quarenta ciclos, até que tenha conciliado teu corpo e tua sombra, para que à luz do deserto sejam uma só coisa, um só lado, sem avesso nem direito.

- A sombra é o indício da realidade que somos, da qual nos envergonhamos e reprimimos. Conciliar corpo e sombra exige iluminar a consciência sobre nos mesmos, os nossos potenciais e as nossas fraquezas, sem nos envergonharmos da verdade daquilo que somos. Quanto maior forem tuas máscaras, teus preconceitos, maior e mais densa será tua sombra.

- Quando alguma coisa não está bem, a vida nos convida a fazer uma mudança. Se não aceitamos a mudança surge o desconforto, a dor e a doença. Pensamos que dor e a doença são para serem eliminadas, curadas, quando na verdade são apenas sinais de que devemos mudar. O sofrimento é a escolha de não mudar diante da doença e da dor. O mal está em nós, nos nossos preconceitos, nos nossos olhos, nos nossos pensamentos, no nosso coração.

- Queremos ser fortes e enfrentar o sofrimento. Mas, esquecemos que o tenro broto e o frágil recém nascido é que se abrem a vida, enquanto aquilo que endurece e se fortalece está vivendo seus últimos dias: “aquilo que é tenro e frágil é aliado da vida e aquilo que é duro e forte é aliado da morte”.

Então, a criatura caminhou até o portal atravessando a parede como um fantasma. O andarilho sentiu medo, pois não se sentia preparado. Então, seguiu o conselho. Voltou para o deserto para conciliar-se consigo mesmo. Talvez um dia esteja preparado e quando esse dia chegar irá enfrentar novamente O Muro da Caveira.

Jasmim Manga

Jasmim Manga

Formosura 
bronzeada 
de formato 
escultural.
Plumeria rubra
Frangipani
inflorescência
iridiescente
cacho de flores 
rosadas 
amareladas
coroando
a América 
tropical.

segunda-feira, 28 de abril de 2014

A cura


A CURA

Marco Mendes

Saiu o diagnóstico: Carcinoma! O silêncio calou fundo, o casal entreolhou-se e os olhos estavam mudos. O coração de Murilo esqueceu-se de pulsar e sua mulher levou as mãos ao rosto cobrindo o choro, que vazava pelos vãos dos dedos. 

O médico em pé, afagou o ombro de Joelma procurando dar consolo:

- Tenham fé. Tudo vai dar certo ao final. O grupo histológico da doença é favorável. O prognóstico de cura é grande, mas a cirurgia é necessária, seguida da iodoterapia.

Foram para casa em silêncio, arrumando forças para dar a notícia à filha. Murilo ficou encarregado da notícia, pois Joelma não conseguia o necessário equilíbrio emocional. Chamou a filha no escritório da residência e seguindo seu estilo direto e franco disse:

- Filha, fomos conversar com o médico sobre os exames. A notícia não é muito boa. Você terá que passar por uma cirurgia...

Antes de terminar a frase, Miriam apavorou-se e começou a chorar.

- Eu não quero, eu não quero!

- Filha, é preciso. Isso pode se tornar um câncer! Você terá que tirar.

Murilo não teve coragem de dizer a verdade e preferiu contornar a situação e abrandar o problema. Abraçou a filha, afagou seus cabelos e beijou sua testa.

- Força filha, estamos juntos, todo mundo junto. O doutor disse para termos esperança, tudo vai dar certo.

A cirurgia tinha sido marcada para o dia seguinte. Logo pela manhã  Joelma e Miriam apresentaram-se à portaria do hospital para fazer o "check in" e foram conduzidas ao quarto por uma das enfermeiras. A enfermeira pediu que Miriam se trocasse e vestisse um avental. Em seguida saiu deitada na maca para a sala de cirurgia que durou quatro horas, enquanto Joelma permaneceu fazendo suas orações no quarto. Murilo não conseguiu ficar ali, pois seu coração estava muito aflito. Então saiu para dar uma volta. Cada segundo parecia uma etermindade.

Pouco tempo depois do retorno de Murilo ao Hospital e encontrar Joelma, Miriam retorna da cirurgia desacordada com um corte e uma sonda no pescoço. O médico havia retirado a tireóide.

- A cirurgia foi um sucesso. Demorou um pouco pois tive que retirar tudo com cuidado para não perfurar a traquéia. Havia metástase e tive que remover alguns linfonodos. Essa noite ela passa no hospital, mas amanhã já poderá receber alta. Disse o médico com o semblante cansado e esgotado. 

No dia seguinte Miriam teve alta e o médico prescreveu cuidados e uma dieta de privação de iodo. Miriam deveria ficar sem ingerir sal iodado por uns 30 dias até que pudesse fazer a iodoterapia.

Não foi fácil ficar sem o sal, pois tudo o que é vendido e comercializado leva sal de cozinha. Miriam passou privações, mas seguiu sua dieta até que agendaram a iodoterapia.

A iodoterapia foi realizada num quarto especial do hospital, todo revestido de chumbo e de acesso restrito. Murilo e Joelma entraram com Miriam. Quando o médico ministrou o iodo radioativo, o contador geiger disparou alertando os pais de que não poderiam permanecer mais no local. 

Murilo e Joelma deixaram sua filha no quarto do hospital e só poderiam vê-la novamente quarenta e oito horas depois, tempo necessário para a descontaminação radioativa. Saíram dali com o coração aos pedaços, tomaram o carro em silêncio e foram parar em uma pequena capela.

Joelma ajoelhou-se, fechou os olhos para ver mais profundamente a luz. Murilo ao contrário, sentou-se numa cadeira, baixou a cabeça fechou os olhos lacrimejantes e sua oração era uma só:

- Meu Deus cure minha filha. Meu Deus cure minha filha.

Nesse momento sentiu algo sobre o joelho esquerdo. Ao abrir os olhos viu uma velha Bíblia marrom ali depositada por Joelma, que depois de levar a Bíblia, retomou a oração.

- Eu não quero ler a Bíblia, eu só quero chorar. Pensou Murilo.

Nesse instante uma voz falou à Murilo:

- Abra a Bíblia na página marcada. Ali tem um texto que escrevi para você antes mesmo de você nascer.

Murilo olhou para o livro e viu a fita que marcava uma página. Abriu a Bíblia e ali havia várias palavras grifadas com marcador de texto, mas o que chamou a atenção foi o título em negrito de um dos capítulos intitulado “A Cura”, evangelho de Mateus 9:27-31:

“Partindo Jesus dali, dois homens cegos o seguiram, clamando: “Filho de Davi, tem misericórdia de nós!” Entrando Ele em casa, aproximaram-se os cegos, e Jesus lhes perguntou: “Credes que Eu seja capaz de fazer isto?” E, responderam-lhe: “Sim, Senhor!” Então, lhes tocou os olhos, dizendo: “Seja-vos feito conforme a vossa fé”. E os olhos deles foram abertos. Jesus os advertiu, então, severamente: “Cuidai para que ninguém saiba disto”. Contudo, ao partirem, propagaram os feitos de Jesus por toda aquela região”.

Depois de ter lido o texto, a voz perguntou a Murilo:

- E você, acha que eu seja capaz de curar sua filha?

Murilo respondeu mentalmente:

- Sim Senhor! 

- Então seja feita conforme tua vontade. Proclamou a voz.

Nesse momento, o coração de Murilo gelou:

- Será que eu tenho fé suficiente para curar minha filha?

A voz prosseguiu:

- Basta se tiver fé do tamanho de um grão de mostarda.

Depois disso a voz retirou-se. Murilo abriu os olhos sabendo que não poderia fraquejar na fé, pois a cura de sua filha dependia disso. Foi até Joelma e a despertou do estado de oração.

- Vamos embora meu amor, nossa filha está curada.

Joelma sorriu, levantou-se e foram embora. Dois dias depois foram buscar a filha no Hospital. Ainda ficou uma semana isolada em seu próprio quarto sem poder ir à escola, em virtude da carga de radioatividade contida no corpo.

A evolução da cura teria de ser acompanhada dali em diante. Mas, a fé de Murilo antecipava a notícia da cura , que se daria há quinze anos para o futuro.

Um ponto na vida


UM PONTO NA VIDA

Por que me olhas como um ponto em tua vida?
Tu gritas pela liberdade, 
mas se fizeres um exame de consciência,
na verdade quer é livrar-se de mim.
Então, terias que negar tua própria vida.
Ainda que lavasses insistentemente teus braços, 
mesmo assim não poderias apagar meus abraços.
Nem que rasgasses as páginas de tua vida,
não arrancarias a impressão que eu deixei em tua genética 
ou o amor gravado nos recônditos de tua ama, 
em lugares que você nem supõe que ele viva. 
Se tu existes é porque eu existi antes de ti.
Para livrar-se de mim,
terás que livrar-se também de si mesma, 
renunciar a si própria, 
pois tu não és senão, 
minha própria consumação. 
Eu vivo por ti e tu existes por mim.

quinta-feira, 24 de abril de 2014

Fulo da vida

FULO DA VIDA

Estou fulo da vida
se é que 
estar fulo é viver.
Vivemos para criar
procriar vida?
Vida nos faz morrer?
Não tenho filhos,
nem tenho prazer.
Eu tinha sonhos.
não tenho família
só trabalho e devoção.
sou filho da vida
estou fulo
a ponto 
de nem me entender.
Vou vender 
o meu pulmão
antes, vou fumar
até desfalecer.
Acho que é o whisky
que bebo
só prá esquecer.

domingo, 20 de abril de 2014

Lavando a vida

LAVANDO A VIDA

É verdade
que estou 
com a cara 
amassada
vendo a vida 
passar
mas, de alma alvejada
clarificada 
das manchas 
de rancor
das nódoas 
de mágoa.
Meu coração 
está limpo!
Na lavanderia 
da vida
perfumei 
meus pensamentos
purifiquei 
meu olhar.

domingo, 23 de março de 2014

Cuidar do homem

CUIDAR DO HOMEM

Cuidar do homem 
é dar-lhe 
os instrumentos 
indispensáveis 
para que 
ele próprio 
possa eleger 
o caminho 
a trilhar. 
Cuidar do homem 
é ensinar 
a se proteger
ser responsável
e discernir.
Cuidar do homem 
não é 
dar-lhe o peixe, 
mas ensinar a pescar.

Água viva

ÁGUA VIVA

Que venha a chuva
trazendo das nuvens
notícia do céu
lavar nossos pés
lavar nossa alma
que chova com calma
a trazer esperança
prá um mundo melhor.

Que venha essa chuva
no coração da terra
restaurar os rios
ribeira felicidade 
fazer brotar nos homens
o fruto do amor
do doce sabor 
da fraternidade.

Que venha essa água
brotando da rocha
matando a sede
do homem descrente
do coração doente
dos olhos ressequidos
por falta de amor.

sábado, 22 de março de 2014

Solidão

SOLIDÃO

Eu nem cheguei a ser 
e já fui.
Nem cheguei lá
e já passei.
Eu apenas pensei
sem nada dizer
me calei.
Não tenho mesmo palavras
diante de tantas reprovações.
Não quero ter a última palavra
por isso fiz 
voto de silêncio.
Um dia 
farei voto de cegueira
não tenho medo da escuridão.
Lá dentro da minha alma
um lume sempre haverá,
palavras da consciência
comigo a dialogar.
A imaginação a pintar
um milhão de quadros
a enfeitar minha tristeza
na sala da solidão.

quinta-feira, 20 de março de 2014

Liberdade de ideias


LIBERDADE DE IDEIAS

Debaixo dos fios
de meus cabelos
mil ideias criei,
pássaros coloridos
na gaiola,
que um dia libertei.

Sabores da vida


SABORES DA VIDA

No fim daquele inverno
marcado por um pingo
de chuva que resistia
Com meus olhos bicolores
eu fugi do meu cercado
a experimentar a vida
em todos os seus sabores.

terça-feira, 18 de março de 2014

Reinventar-se



REINVENTAR-SE

Não minto para mim mesmo.
jamais me abandonei.
Muitas vezes cai,
quase sempre me levantei.

As vezes que não consegui
ali mesmo no chão eu brotei,
segui rastejando como rama forrageira,
mas nunca estagnei.

Já tive a impressão de estar sozinho,
mas de fato me enganei.
Sou tantos em mim,
acho que é por isso,
que tantas vezes me reinventei.

sábado, 15 de março de 2014

Pavão

PAVÃO 

Com seu leque de ilusão 
desabrochou seu encanto. 
Nenhuma sutileza. 
A beleza do pavão 
adiantou-se 
inaugurando 
a estação da flores.

Levança

LEVANÇA

Eu prefiro 
não preferir. 
Todas as vezes 
que escolhi, 
errei, 
perdi, 
desapaixonei. 

Eu prefiro 
deixar acontecer 
sem sofrer 
por antecipação. 

Eu prefiro 
não saber 
o que está 
para acontecer.
Até mesmo
para não falecer
antes do dia 
de morrer.

Eu prefiro fluir
como água 
que brota da terra, 
escoa em riacho
soma-se em rios
para juntos 
desaguarem 
nas águas mar.

quinta-feira, 13 de março de 2014

Lucina

LUCINA

Lucina selenita
Que espreita os enamorados
atiça o uivo do lobo
transtorna a mente dos homens
hipnotiza as marés 
faz o parto prematuro
domina as cabeleiras
não se esconda 
atrás das nuvens cinzentas
não deixe que as noites tenebrosas
venham nos açoitar.


quarta-feira, 12 de março de 2014

Flor do deserto

FLOR DO DESERTO

Aquele que tem 
a capacidade de sorrir 
e estender a mão, 
ainda que tenha 
vontade de chorar 
ou sinta dor, 
tem o poder 
de transformar 
o deserto 
num jardim 
coberto de flor.

É dessas pessoas 
que o mundo precisa. 
Gente que não venta, 
apenas brisa. 
Gente que acalma 
conquista, 
que toca incisivo,
mas não fere,
não pisa.

segunda-feira, 10 de março de 2014

Crazy

CRAZY

Criméia em crise
Azaléia não deu flor.
Panacéia cultural
Coração indolor.

E o sal por onde anda?

Até os Santos 
saltaram do andor.

Nos caminhos 
cobertos de bréu
a luz se escondeu.
Por onde andará o amor?

Deserto

DESERTO
*Marco Mendes

Sob o sol, 
o vento e o frio, 
a fome e a sede
as pegadas 
deixei para trás.
Andei quarenta anos
seguindo apenas a esperança
só a fé a me guiar.
Atravessei meu deserto
venci a soberba
recusei a riqueza
me despi do poder.
Ganhei o fruto da vida
servido pelos anjos.
Me deu a força necessária.
Morri para viver
me perdi 
para me encontrar.

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Baile de máscaras



BAILE DE MÁSCARAS

Exalando cargas negativas
contaminam o ambiente
vivem sem diretivas
não parecem gente.

no lamaçal da vara
chafurdam pérolas raras
ao som da cítara
bailando com suas máscaras.

domingo, 23 de fevereiro de 2014

Rascunhos

RASCUNHOS
 
Não somos o autor 
da própria história, 
que escreve-se 
a muitas mãos. 
Nas cenas da vida 
quem dirige a peça 
é a razão, 
mas cuidado 
com os rascunhos 
guardados na alma, 
as vezes 
entram em cena 
interpretados 
pelo coração.

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

O que será de ti?

O QUE SERÁ DE TI?

EU cobri aqueles 
a quem você deixou 
no frio. 
Tirei minha camisa 
para aquecê-los. 
Eu alimentei 
aqueles que 
você deixou 
sem nada. 
Também tirei 
da minha boca 
para saciá-los. 
Eu levantei 
aqueles que 
você solapou. 
Desci até 
o inferno 
para os resgatar. 
Eu plantei 
flores 
no terreno 
que você jogou 
seu lixo. 
Libertei 
os passarinhos 
que você aprisionou. 
Agora 
não venha 
com esses olhos 
do gato do Shirek 
pedir que eu 
te abrigue num lar 
que você nunca 
cultivou.

Minha força, meu cansaço

MINHA FORÇA, MEU CANSAÇO
*MMendes 
Minha força
é mistério
pois em mim mesmo
não acho

Sovada e assada
a massa
me farto de pão
o vinho
vem de graça

Na aspereza
do chão
lixado com
palha de aço
no suor que
escorre
pelo rosto
descanso
meu braço

Nos lençóis
que estendo
sobre as camas
[de gato]
é que restauro
do cansaço.

No final
de cada dia
Fecho os olhos
agradecido
pois é nos sonhos
e na vontade
de sonhar
que no final
de cada dia
que me refaço

terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

Ressuscitar sempre


RESSUSCITAR SEMPRE

Vou me recolher,
me esconder,
quase um morrer.
Olhos fechados,
espírito em fuga
para um outro lugar,
onde de fato
ninguém poderia estar,
senão eu mesmo.
Vou dormir,
esperando que a morte
seja assim, um sopitar.
Amanhã ressuscitar,
mais vivo do que antes,
para o dia eterno,
enquanto a eternidade
insista em durar.

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

O fruto da cruz

O FRUTO DA CRUZ
*MMendes

Ombros condecorados

de fardos pesados

de sofrimento e dor.


Rosto maltratado,

mãos calejadas,

das pelejas da vida

sem me entregar.


Depois do desterro

um leve suspiro

um minuto de sorriso

pernas tremulas 

tentando firmar


Plantei minha cruz.

Não deu sombra.

Sou seu fruto,

que deixaram dependurado,

até que caísse passado,

e a terra viesse devorar.


Mas não vivi em vão.

Isso não!


Ainda que levasse nos ombros

aqueles que, 

embora tivessem pernas,

se recusavam andar,

eu cheguei perto de ser feliz

[ claudicante, é verdade ]

se é que a felicidade é um lugar de se estar


Com minhas próprias pernas

abri caminhos

que alguns puderam passar e chegar

onde eu nem em sonho chegaria

onde eu, filho de padeiro

nem me atrevi imaginar.