segunda-feira, 30 de maio de 2016

Pablito, as mãos dos meus avós

PABLITO, AS MÃOS DOS MEUS AVÓS

*MMendes


Os avós de Pablito viajaram para visitar seus pais na cidade natal. É importante que não esqueçamos nossos pais, pois é lá que fincamos nossas raízes, por onde corre a seiva que nos da sentido de onde viemos e para onde vamos. Como é bom encontrar nossos pais, poder beijar-lhes o rosto e as mãos.

Como são belas as mãos de nossos pais, com suas grossas veias azuladas sob a pele manchada como por gotas de terra. Mãos que no entardecer da vida possuem muito mais luz do que outrora. Luz que emana das mãos de quem juntou gravetos, longamente, tentando acendê-los contra o vento. “Ah, Como os fizeste arder, fulgir, com o milagre das tuas mãos”, disse Mário Quintana.

Depois de três dias e meio de viagem vovô e vovó retornaram. Quando Pablito os viu, correu para dar um abraço apertado na vovó. Com os braços enlaçados em seu pescoço permaneceu por um longo tempo com a cabeça recostada em seu ombro. Depois fez a mesma coisa com o vovô. Há gestos que não se traduzem totalmente em palavras, mas se o gesto do netinho pudesse falar, diria: “Por que demoraram tanto? Que saudades eu fiquei! Pensei que nunca mais iriam voltar”.

Como se lesse o coração do neto, vovô respondeu:

- Eu também fiquei morrendo de saudades de você, meu querido.

Pablito deu um sorriso e chamou vovô para brincar com seus dinossauros no quarto de brinquedos. Foram todos para lá. Sentado no meio dos avós, Pablito uniu as mãos do vovô e da vovó em seu colo:

- Vovô e vovó, vocês me “aprotegem”?

- Vovó, eu amo sua mão! Vovô, eu amo sua mão, também.

Então os dois abraçaram o netinho e o encheram de beijos. Precisava ver a carinha de felicidade da criança. E dos avós então?

À medida que envelhecemos descobrimos a razão de termos duas mãos. Uma é para servir a nós mesmos, a outra para oferecer aos netos. Quando oferecemos nossas mãos, no fino tear do destino misturamos nossas próprias vidas. Acho que foi imbuída desse sentimento que Cora Coralina escreveu “nas palmas de tuas mãos leio as linhas da minha vida”.

Como é boa essa experiência de ser avô. Nesse tear da vida eu ainda sinto o calor da chama das mãos de meu avô e de meu pai segurando a minha mão, eu segurando a mão de meu neto, para que o fogo do amor arda continuamente sobre o altar da vida e nunca se apague.

sábado, 21 de maio de 2016

Pablito, troca de papéis

PABLITO, TROCA DE PAPÉIS. 

*MMendes


Pablito pediu ao vovô que também se sentasse no chão do quarto de brinquedos e lesse um livro sobre a vida dos dinossauros. Vovô até começou ler, mas logo depois do almoço o corpo sofre uma espécie de torpor. Acometido daquela leseira vovô deu uma parada na leitura...

- Vovô, o que foi? Perguntou Pablito.

- Ah, Pablito, me deu sono meu querido. Disse vovô fechando o livro e deitando-se ali mesmo no chão.

Então Pablito levantou-se, pegou o travesseiro que estava sobre o sofá e acomodou cuidadosamente a cabeça do vovô. Depois chegou perto e deu-lhe um beijo no rosto.

- Durma com os anjos vovô. Quanto você acordar a gente continua.

O coração do vovô sem encheu de ternura. Pablito estava cuidando do vovô. É como disse Madre Teresa: “Ao cuidar do outro, ofereça-lhe também o vosso coração”. Aquele que nos olha com amor, lembra-nos a todo instante que temos valor. O cuidado nasce justamente do sentimento de pertença, que é o respeito à comunhão que todas as coisas entretêm entre si e conosco. Assim como o coração do vovô estava com o neto, o coração do neto também estava com o vovô.

Vovô e Pablito estavam ali vivendo papeis opostos. O vovô recebendo o cuidado e o Pablito cuidando do vovô. Ali puderam se conhecer mais profundamente. O vovô sabia agora como se sentia o netinho quando recebia seu cuidado e o Pablito sabia como fazia bem ao vovô cuidar do netinho.

Viviam na realidade a poesia de Jacob Levy Moreno: “E quando estiveres próximo tomarei teus olhos e os colocarei no lugar dos meus e tu tomarás meus olhos e os colocarás no lugar dos teus. Então te olharei com teus olhos e tu me olharás com os meus”.

Agora eu sei meu netinho, que o gosto do amor que eu te dou tem um sabor inconfundível de estar repleto de felicidade.

segunda-feira, 9 de maio de 2016

Pablito, alma de poeta

PABLITO, ALMA DE POETA

*Por MMendes

- Espere um pouco. Disse Pablito correndo para detrás da parede da passagem lateral da sala de estar.

- Vovô, agora você me apresenta!

- Senhora e Senhores, vovós e mamães, agora com vocês, Pablito o grande poeta! Anunciou vovô apresentando a neto, que correu para lance mais alto da sala e começou a declamar a poesia, As Borboletas de Vinícios de Moraes, que havia aprendido na escola.

No final daquela tertúlia Pablito gritou:

- Vem vovô, me dá um abraço! Os dois se abraçaram e rodopiaram pela sala festejando a vida.

Através da poesia o menino transformava a palavra em brinquedo. Na poesia o que importa não é a realidade, mas a imaginação que se pode despertar com o jogo de palavras. Pablito encheu a sala da casa do vovô de luz, borboletas brancas, azuis, amarelas e pretas.

Quem planta amor atrai mesmo borboletas, pensava vovô, concordando com Walter D. Elhers quando disse: “Não corra atrás das borboletas; plante uma flor em seu jardim e todas as borboletas virão até ela”. Vovô saboreava os frutos do amor vivido no ambiente familiar e regozijava-se com as borboletas declamadas pelo neto.

Quando somos amados é mais fácil aprender amar. Longe de ser um sentimento, amar é uma visão do outro e do mundo, capaz de acolher todos e fazer o bem a cada um. Quando amamos transformamos tudo o que tocamos. Chaplin traduziu a modernidade como o mundo que precisa muito mais de humanidade do que tecnologia. De fato, necessitamos mais da poesia, da afeição e doçura, do que de inteligência racional, pois sem essas virtudes, o futuro estará perdido e a vida será pura violência.

Amar não é fácil! A melhor explicação sobre as dificuldades e vantagens do amor é aquela que a flor deu ao Pequeno Príncipe na obra de Antoine de Saint-Exupéry: “É preciso que eu suporte duas ou três larvas se quiser conhecer as borboletas”.

quarta-feira, 4 de maio de 2016

Pablito, a barba do meu avô

PABLITO, A BARBA DO MEU AVÔ
*Por MMendes


- Vovô, e essa barbinha aqui? Disse Pablito tocando a barbinha logo abaixo do lábio inferior do avô.

- E essa barbona aqui? Disse o netinho acariciando a barba do vovô com as mãozinhas. Em seguida, começou a beijar e beijar e beijar a barba do vovô. Depois abraçou-o e ficaram ali abraçados por algum tempo.

Há quem sustente que a barba disfarça os pontos fracos do rosto, faz o homem parecer forte, com um ar mais maduro, sofisticado e viril. Curiosamente a barba parece nos dar todos os anos que não iremos de fato conseguir em toda uma vida. A barba sempre foi símbolo de honra e sabedoria. Deuses, heróis e sábios da antiguidade são representados com barba.

Sem palavras, aquele abraço de Pablito dizia tudo isso. E mais, o abraço de Pablito parecia dizer: “Conserve Deus a vossa abençoada barba, para que cada fio de tua barba seja minha proteção, meu aconchego, minha alegria”.

Acho que a barba do vovô despertou memórias coletivas compartilhadas entre os dois. Dizem que as memórias coletivas são herdadas e compartilhadas a partir da relação com o outro. Então vovô lembrou-se de seu avô Aleixo, o trisavô do Pablito, que depois de escapar de um grave acidente de carro deixou a barba crescer. Enquanto Pablito abraçava o vovô, vovô também abraçava em espírito seu avô.

Naquele momento especial o coração de vovô declamou em oração um poema de Shakspeare: “A longa distância apenas serve para unir o nosso amor. A saudade serve para me dar a absoluta certeza de que ficaremos para sempre unidos”. Aquele gesto do neto abriu espaço para um especial momento de amor entre netos e avôs.

Obrigado meu netinho, por esse momento tão íntimo e especial. Obrigado por me fazer sentir no teu abraço, o abraço do meu querido avô.