quarta-feira, 4 de outubro de 2017

PABLITO, os últimos serão os primeiros


PABLITO, os últimos serão os primeiros.

*Por Marco Mendes


Depois de ouvir uma leitura de uma passagem da Bíblia, Pablito questionou o vovô:

- Por que os primeiros serão os últimos e os últimos serão os primeiros?

O menino parecia confuso, porque essa assertiva quebrava a lógica do merecimento, apresentando-se como uma injustiça ao vencedor.

Diante de profunda questão filosófica vovô silenciou. Era preciso estudar e meditar. Vovô precisava não só de uma resposta, mas que a resposta fosse clara e simples, a ponto de Pablito pudesse compreender. Seria possível que a pergunta fosse tão elevada a ponto do espírito de uma criança não poder alcançar a resposta? Vovô se lembrou de um provérbio que diz “O sábio ouvirá e crescerá em conhecimento, e o entendido adquirirá sábios conselhos”.

A pergunta de Pablito nos remete à forma de como nos relacionamos uns com os outros. Se o outro é visto como um concorrente, sou competitivo. Se o outro é visto como um aliado, sou cooperativo. Há um enorme abismo social num mundo bipolar dividido entre os primeiros e os últimos. Poucos são os vencedores abastados e muitos os vencidos desprovidos de quase tudo.

A assertiva contida na pergunta de Pablito propõe que a grande vitória da humanidade é acabar com as desigualdades sociais, cooperando uns com os outros para que os excluídos possam superar as barreiras, sejam elas sociais, morais, econômicas, físicas ou intelectuais, construindo uma ponte que nos leve a um mundo mais inclusivo, igual e fraterno.

Acho que é isso meu querido netinho. Devemos nos cuidar para que nosso egoísmo e nossos próprios interesses não sejam os primeiros a subir no pódio, deixando por último as outras pessoas e todo o resto da Criação. No final somos todos iguais em tempos diferentes, pertencemos e dividimos a vida no mesmo planeta.

segunda-feira, 12 de junho de 2017

Pablito, a força da oração


PABLITO, a força da oração
* Por Marco Mendes


- Vovô, essa noite eu não dormi bem.

- É mesmo querido! Por que?

- Eu não escutei você rezar, vovô.

Todas as noites vovô fica com Pablito no quarto até que ele adormeça. Enquanto o menino mama, vovô reza por todos, inclusive por ele.

Nessa noite Pablito adormeceu assistindo televisão e o vovô o levou para seu quarto. Vovô fez sim suas orações, mas como Pablito estava dormindo, não escutou.

Muitos podem não crer na força de uma oração, mas a oração original que brota do coração gera força suficiente para mudar o destino do mundo. E como o mundo precisa da energia de uma oração, muito mais do que a energia das batalhas. “Aqueles que oram fazem mais pelo mundo que aqueles que lutam; e se o mundo vai de mal a pior, é porque existem mais batalhas do que orações", disse o oficial norte-americano George S. Patton.

Pela oração alcançamos os ouvidos de Deus sussurrando uma prece pela abertura na alma, buscando alcançar o intangível para realizar o impossível. Nem as lágrimas, nem as velas acesas, nem as flores sobre o altar possuem a força de uma pequena oração, pois só a oração é capaz de transcender e chegar ao trono de Deus.

Nunca abandone a oração porque não consegue orar, pois é justamente nos momentos em que as palavras nos faltam e nos sentimos sem forças, debilitados, fracos é que são feitas as verdadeiras orações. Deus ouve até o silêncio de nosso coração.

Pelo jeito as orações do vovô fazem bem ao Pablito. Quando a oração penetra o coração humano quebra o véu que separa a Terra e o céu, aí sentimos o poder da presença de Deus e tudo o que era impossível pode acontecer.

terça-feira, 30 de maio de 2017

Pablito, a quase invisível gratidão


PABLITO, a quase invisível gratidão.

*Por Marco Mendes

Sempre que Pablito vai à missa fica ansioso esperando o momento depois da comunhão, quando os acólitos distribuem pãezinhos às crianças. As crianças a princípio deveriam atender ao apelo de ficarem em fila, mas nem sempre isso acontece.

Pablito sempre obedece uma fila imaginária e fica esperando até que alguém lhe ofereça o pão.

O pãozinho tem um formato espiralado. De posse dele, repetindo uma brincadeira do vovô, o menino brinca e sorri colocando o dedinho por baixo como se o pãozinho fosse um caracol. Depois oferece um pedaço para o vovô e para a vovó.

No último domingo quem serviu os pãezinhos foi uma conhecida da mamãe de Pablito. Ela comentou que ele foi a única criança a dizer “obrigado” quando recebeu o pãozinho.

Atitudes quase invisíveis como o ato de agradecer é que dão formato a todas as coisas visíveis, pois o mundo é um reflexo daquilo que é invisível. Palavras e atitudes constroem pessoas e coletividades, que por sua vez dão vida à realidade que nos cerca.

O caráter de uma pessoa grata revela que ela é fiel e por isso nunca nos abandonará. Uma pessoa grata é uma pessoa em quem se pode confiar.

Atualmente agradecer é uma atitude quase em desuso, um valor à margem da nossa cultura moderna. Talvez porque o orgulho tenha sufocado também a humildade. A gratidão é o único tesouro dos humildes, que com gratidão pagam a todos que lhes servem. Como disse Charles Chaplin, nesse mundo conturbado e louco em que vivemos, necessitamos mais de humildade que de máquinas. Mais de bondade e ternura que de inteligência. Pois sem isso, a vida se torna violenta e tudo se perderá.

Pablito, embora pequenino, sabe que o pão é sagrado, porque é fruto de um conjunto de esforço daqueles preparam o solo, plantam, colhem, trabalham os grãos, assam a massa e o repartem para o bem de todos. Que a entrega de todo esse serviço se paga com o agradecimento.

Meu netinho ali na missa demonstrava uma quase invisível gratidão, invisível aos olhos apressados de muitos homens e mulheres que já não se lembram de ensinar os filhos a esperarem a vez e agradecer aquilo que recebem. Mas não passou desapercebida por uma mocinha, que com olhos ternos, viu numa fração de segundos, a eternidade da grandeza do valor da gratidão.

O Reino de Deus é assim pequenino como o sussurro tímido de agradecimento de uma criança, que cresce no coração da gente e nos enche de amor e esperança.

segunda-feira, 24 de abril de 2017

Pablito, meu anjo da guarda


PABLITO, meu anjo da guarda

*Por Marco Mendes


- Vovô, estou com sono. Vamos dormir?

Era chegada a noite e Pablito estava abrindo a boca de sono. Subiram as escadas enquanto todos os demais ficaram no andar de baixo assistindo um filme na TV. Vovô trocou o menino, apagou a luz e deitaram-se. Depois de rezarem uma Ave Maria vovô se pôs a explicar ao neto a primeira parte da oração:

- Antes que a mamãe do bebê Jesus soubesse que estava grávida, no escurinho do quarto o anjo Gabriel apareceu para ela e disse que ela ficaria grávida de Jesus. Ele disse à Maria que era uma mulher feliz porque Deus a escolheu para ser a mãe do bebê Jesus. Que esse menino era bendito, porque iria crescer e nos ajudar a encontrar Deus. A oração que acabamos de rezar repete justamente as palavras do anjo Gabriel:

- "Ave Maria, cheia de graça, o Senhor é convosco, bendita sois sós entre as mulheres e bendito é o fruto do vosso ventre Jesus". O ventre é a barriga da mamãe e o fruto é a criança que está dentro dela esperando para nascer.

Pablito ficou escutando aquelas palavras na penumbra deitadinho ao lado do vovô. Ao final das explicações fez uma inusitada indagação:

- Vovô, e quando minha mãe ficou grávida de mim, também um anjo apareceu para ela?

Aquela pergunta surpreendeu vovô, que respondeu logo em seguida:

- Sim meu querido. Também um anjo apareceu para sua mamãe.

- E quem era ele vovô?

- Esse anjo era eu. Quando eu fiquei sabendo que sua mamãe estava grávida eu a abracei e disse que ela era muito bem-vinda em minha casa, que o bebê que ela carregava na barriga seria muito amado. Esse bebê era você.

Passados uns minutinhos Pablito adormeceu abraçadinho ao vovô. Então vovô sussurrou em seu ouvido:

- O Senhor fez em mim maravilhas e santo é o Seu nome. Bendito és tu, meu netinho, que veio semear amor em nossa casa.

Para quem não sabe, Pablito é filho de uma adolescente chamada Maria, que o concebeu com quinze anos de idade. No dia em que vovô recebeu a notícia seu coração estremeceu. Vovô chorou dois dias por medo do futuro, até que na solidão de sua angústia uma voz lhe disse:

- Assim como Jesus nasceu de uma jovem solteira, eu vôs anuncio seu neto (por intuição vovô sempre soube que seria um menino). Receba-o assim como Jesus foi recebido pelos avós maternos. Ninguém vem ao mundo antes da hora, nem por acaso, senão por permissão e propósito do plano de Deus.

O Papa Francisco afirmou que “mãe não é estado civil. Por isso, não existe mãe solteira”. Era preciso acolher aquela mãe que não estava totalmente preparada para a maternidade. Essa jovem mãe precisava mesmo era de um anjo da guarda. Podemos escolher o que plantar, mas somos obrigados a colher o que semeamos. Há coisas na vida que não podem ser expressas em palavras, apenas em gestos. Então, naquela mesma noite vovô bateu à porta do quarto de Maria.

- Quem é?

- É o pai?

- O que você quer?

- Conversar com você?

Maria abriu uma fresta da porta por onde passava apenas um dos olhos.

- Não podemos conversar por uma fresta. Venha para fora do quarto.

Quando Maria saiu, pôs-se em pé em frente ao pai, baixou a guarda esticando os braços e fechou os olhos esperando o pior.

- Posso te dar um abraço? Disse vovô abrindo os braços. Pai e filha se abraçaram e choraram muito.

- Eu poderia te acusar de muitas coisas nesse momento, mas nada disso mudaria a história que começou a ser escrita para nós. Tudo isso é novidade para mim e também para você. Esse é o momento que você mais precisa de mim e estou aqui com você. Comecemos uma nova história, uma história de amor. Você é bem-vinda em minha casa e seu filho também. Fiquemos juntos e tudo terminará bem. O tempo se encarregará de ajeitar tudo. Então demos tempo ao tempo.

Como diz o Padre Fábio de Melo: “Quando a noite esconde a luz, Deus acende as estrelas”. A primeira frase que Pablito disse ao vovô foi “eu te amo”. E essa é a frase repetida todos as vezes que os dois se encontram, se abraçam e se beijam. E eu sou testemunha de que isso acontece muitas vezes todos os dias.

Pablito, rasgando dinheiro



PABLITO, rasgando dinheiro

*Por Marco Mendes


Pablito faz aulas de natação para criança e se sai muito bem. Dias atrás a professora lançou um desafio de atravessar a piscina sem respirar. Quem conseguisse sentaria no tapete dos campeões. Pablito foi o primeiro a conseguir e agitava-se quando outro concorrente perdendo o fôlego colocava a cabeça para fora e respirava. Quando isso acontecia, sentado no tapete dos campeões, com o punho da mão cerrado, puxava o braço para baixo como quem puxa a corda do apito do trem.

- Yes! Vibrava o menino.

Mas acho que o guri andou meio cansado do esforço exigido pelo esporte. Outro dia não quis ir participar da aula na terça-feira. Quando o vovó chegou de viagem na quinta-feira teve uma conversa carinhosa com neto. Disse o quanto gostaria que ele continuasse na natação. Pablito se comprometeu ir à natação na semana seguinte. Contudo, quando chegou o dia ele se recusou a entrar na piscina novamente.

- Mamãe, eu não quero entrar na piscina. Estou cansado.

A professora insistiu com ele:

- Entre Pablito, venha para a água com seus amiguinhos.

Mas o menino estava decidido a não entrar... talvez nunca mais. Foi quando a mamãe apelou:

- Pablito, o vovô paga sua natação e toda vez que você não quer ir o vovô fica rasgando dinheiro.

Nesse momento o menino saiu correndo em direção a piscina gritando:

- Professora! Professora! Eu vou nadar sim, senão meu avô vai ficar rasgando dinheiro! E tibum.... mergulhou, enquanto as outras mãe ficaram rindo de seu comportamento.

Nascemos com potencial para sermos tudo o que quisermos, mas tornar isso realidade depende de muito esforço. As vezes queremos desistir e é preciso que alguma força interna, um amor maior, nos dê a energia necessária para prosseguir até o fim. Como disse Clarice Lispector "existe um grande, o maior obstáculo para eu ir adiante: eu mesma. Tenho sido a maior dificuldade no meu caminho. É com enorme esforço que consigo me sobrepor a mim mesma...".

O amor de Pablito pelo vovô foi derradeiro para que o menino vencesse o desânimo e pulasse na piscina. Não sabemos ao certo o que ele pensou que aconteceria se o vovô rasgasse dinheiro, mas com certeza em seu íntimo sabia que isso não era justo com o vovô. Pode ser que lá em seu inconsciente coletivo conhecesse a simbologia da prática das culturas orientais de rasgar as roupas como demonstração de emoções fortes, angústia, tristeza. Dessa forma, se o vovô rasgasse dinheiro isso seria sinal que o vovô ficaria angustiado e triste.

Para alguns o dinheiro pode ser apenas sinal de poder, para outros o dinheiro significa o suor do trabalho. O ex-presidente do Uruguai José Mujica certa vez afirmou que "quando compro algo, ou você compra, não pagamos com dinheiro, pagamos com o tempo de vida que tivemos que gastar para ter aquele dinheiro. Mas tem um detalhe: tudo se compra, menos a vida. A vida se gasta. E é lamentável desperdiçar a vida...". E Pablito não queria que o vovô desperdiçasse sua vida.

Eu penso mais ou menos como Mujica, mas a vida que gasto com meu neto é o melhor investimento que faço com meu trabalho. Investir nas crianças é o caminho para salvação da humanidade. Como bem lembrou o juiz paraibano Onaldo Queiroga: "Esqueçamos as guerras e lutemos por uma criança feliz, pois só assim, erradicaremos uma legião futura de adultos incapazes de praticar a paz".

Pablito, azul é a cor do encontro, do céu e do mar



PABLITO, azul é a cor do encontro, do céu e do mar

*Por Marco Mendes


Numa manhã de céu azul claro e sem nuvens, a caminho da escola Pablito estava a sonhar:

- Vovó, você sabe por que o céu é azul?

- Acho que eu não sei não, Pablito.

- Ah vovó, é porque ele fica pertinho do mar! Você não sabia que o céu encontra o mar?

O encontro do céu e do mar contém um simbolismo tão imenso, mas cabe no coração de Pablito. Acho que é porque o coração do menino é assim como uma janela para a vida, como poetizou Carlos Drummond de Andrade: " o mundo é grande e cabe nesta janela sobre o mar".

Afinal, encontro do azul do céu e do mar será uma cor em si, será uma nostalgia ou uma questão de distância que o coração quer alcançar? E para onde nos leva o azul? Não há outro azul na vida que não seja o azul do céu e o azul do mar. No céu o infinito azul do sonhar, no azul do mar floresce a vida, no encontro dos dois a vontade de viver, sonhar e amar. Amar é assim um elo entre o azul do céu e o azul do mar.

Ah, o coração de criança de Pablito ainda tem tempo de olhar para o azul do céu e sonhar com o mar. O entardecer da vida talvez fosse azul, não houvesse tantos desejos de consumo e preocupações vãs que nos impedem de sonhar.

Todos nós buscamos fugir das tormentas para além dos horizontes, levados pelo sopro do vento que nos tire de uma vida de terrível calmaria. Pablito tem um coração de marinheiro aventureiro, que sai em busca dos tesouros escondidos, para aqueles que ousam cheios de esperança, transpor os horizontes que nunca estão no mesmo lugar. O coração sabe que para além do horizonte há um porto seguro, onde aguardam os amores deixados e que ansiamos por reencontrar.

Pablito desperta para aventura da vida guiado pelo azul, que leva ao encontro. Caminha ensinando, talvez ouvindo os conselhos do poeta Tim Maia, que nesta vida é preciso buscar sempre algum motivo prá sonhar, ter um sonho todo azul, azul da cor do céu, azul da cor do mar.

Obrigado meu netinho, por me fazer olhar para o céu, sem esquecer de que para alcançá-lo é preciso navegar pelos mares da vida, buscar o encontro do azul que nos leva ao céu quando estamos dispostos a amar.

E para você eu meu querido, dedico essa poesia de Carlos Drummond de Andrade: " Se um dia olhar para o céu e não te ver, é que sou a onda do mar e não consigo te esquecer, sou feliz do teu lado sem do seu lado estar, pois você é isolado no meu modo de pensar, quando estou triste e não tem solução, lembro que você existe e mora no meu coração!"

Pablito, quem roubou o meu amor?


PABLITO, quem roubou o meu amor?

*Por Marco Mendes

- Vovô, por que minha mãe chama meu pai de amor?

- É porque eles são namorados meu querido.

- Nada disso! Minha mãe é minha mãe e meu pai é meu pai.

- E eu e a vovó podemos ser namorados?

- Você e a vovó podem, mas a mamãe e o papai não. Regras são regras!

Fiquei matutando o que esse menino quis dizer com “regras são regras”. Afinal, que regra era essa que impedia a mamãe e o papai de namorarem? Foi ai que caiu a ficha. Pablito arrogava para si o direito de ser o único amor da mamãe. Essa era a sua regra. Por isso questionou o fato da mamãe estar infringindo sua regra chamando o papai de amor. Pablito estava vivenciando o famoso complexo de Édipo.

Segundo a psicanálise, pelo complexo de Édipo forma-se uma relação amorosa entre o menino e a mãe. Mas logo o menino descobre que sua mãe possui um outro amor, o pai. Essa descoberta funciona como uma castração. Faz o menino compreender que não é ele quem define todas as regras e que não pode fazer o que bem entende. A vida, a família e a sociedade impõem regras, limites e padrões que devemos respeitar. É a descoberta da lei. A criança percebe que seus pais não podem dedicar-se somente a ele porque estão inseridos num contexto sociocultural.

Pablito está crescendo e descobrindo que o mundo não gira a sua volta. Que há coisas permitidas outras proibidas e que a vida exige escolhas e muitas renúncias. Não podemos ter tudo que queremos e somos obrigados a eleger prioridades. Mas quem disse que isso é ruim? Como disse a escritora dramaturga Maria Clara Machado “aprendi que amadurecer dói, mas o fruto pode ser bom”.

Meu querido netinho, aqui vai um conselho: “O verdadeiro amor é deixa-la ir, para ver se ela volta” (do filme O lado bom da vida).

segunda-feira, 13 de março de 2017

Pablito, é machismo?



PABLITO, é machismo?

*Por Marco Mendes

- Vovô, por que você deixou a mamãe aqui na escola?

- Ela faz faculdade de psicologia, meu querido Pablito. Respondeu o vovô.

- Ela está estudando para ser psicóloga, né vovô?

- Sim Pablito, ela vai ser formar e ser psicóloga.

- Depois que ela terminar de estudar ela vai trabalhar em casa ou fora de casa? Continuava Pablito

- Acho que vai trabalhar fora de casa. Respondeu ao netinho.

- Ah não! Eu não quero! Eu quero que ela trabalhe em casa. Protestou o menino.

- Mas como ela irá trabalhar em casa? Vovô questionou o netinho.

- No computador, ué!

A mamãe parece que arrumou um problema a ser resolvido. É que ela é defensora do feminismo. Não me entendam mal! Feminismo no sentido oferecer oportunidades de vida e divisão de tarefas dentro e fora da casa, de forma igual para homens e mulheres. E trabalhar fora em igualdade de condições com os homens no mercado de trabalho passa a ser uma dessas defesas. Mas parece que Pablito não está muito contente com essa ideia.

Um dos paradigmas fundamentais a serem quebrados pelo feminismo está justamente ligada ao conceito da maternidade. Maternidade no sentido de uma cultura segundo a qual as mulheres teriam um destino social de serem mães, donas de casa, cuidadoras da família e dos filhos. As feministas afirmam que a luta da mãe feminista é justamente ensinar os filhos homens que quando eles forem pais terão tanta obrigação de cuidar da casa e dos filhos quanto as mães.

O problema se torna complexo ao percebemos que os filhos pequenos estabelecem uma relação diferencial com a mãe. Desde o nascimento os dois estabelecem uma relação íntima e exclusiva, uma comunicação de contato, olhares e sutilezas que só eles sabem decodificar. Os sinais emitidos entre eles dão um significado ao amor que um sente pelo outro. E é por isso que o bebê adora estar pertinho e aninhado a sua mãe, afirma a psicóloga Regiane Glashan.

Sustentar convicções pessoais sempre farão inimigos, especialmente quando ferem os interesses alheios. Mas quando esse inimigo é o próprio filho, então a mãe tem um grande problema. Enquanto a mamãe defende o feminismo em contraposição ao paradigma social conservador da maternidade, Pablito, como um pequeno grande conservador, defende que em razão da maternidade a mamãe deva ficar em casa, ao lado dele! Que bela enrascada a mamãe se meteu.

O vovô acredita que Pablito não está dizendo que mulher deve trabalhar em casa. Está dizendo que ficar longe do contato da mamãe será muito difícil para ele. Por isso quer a mamãe em casa, pertinho dele. Esse é um problema que terão que resolver. O vovô aconselha mamãe e Pablito: Grandes problemas só podem ser resolvidos com um amor maior ainda.

terça-feira, 7 de março de 2017

Pablito, somos todos mortais

PABLITO, SOMOS TODOS MORTAIS

*Por Marco Mendes

Numa tarde de domingo Vovô e Pablito estavam passeando pela praça do bairro, quando o netinho veio com uma pergunta inusitada:

- Vovô, você já está meio velhinho?

- Um pouquinho velho, mas ainda não estou muito velhinho.

- Você vai morrer?

- Meu querido, um dia todos morreremos. Mas não fique preocupado, ainda temos muito que viver.

Fechando os olhinhos com rostinho de sofrimento Pablito abraçou as pernas do vovô e disse:

- Ah vovô, eu não quero que você morra, nunca.

Depois desse dia o netinho estava assistindo a um filme de família de 20 anos atrás e comentou:

- Vovô, por que você está tão diferente nesse filme?

- É porque eu era mais novo Pablito. Eu envelheci um pouco e mudei a aparência.

Para descontrair vovô disse que o netinho também havia mudado desde que nasceu.

- Somos mutantes Pablito, como aqueles do filme X-man.

Enxugando as lagrimas dos olhos com os dedinhos Pablito suplicou:

- Vovô, por favor, não fique diferente não.

- Você está com medo que o vovô fique muito velho? Perguntou ao netinho.

- Sim. Eu não quero que você fique velho não. Disse o menino quase chorando.

Pablito achava que morríamos só de velhice, até que escutou uma história de um bebê que havia nascido e falecido com 20 dias. Então interpelou a vovó:

- Esse nenezinho morreu também? Morreu como?

- Morreu porque tinha um dodói. Disse a vovó.

Apontando para um raspadinho do joelho resultado de um tombo no quintal, com os olhos arregalados Pablito perguntou:

- Vovó, eu tenho um dodói no joelhinho. Vou morrer também?

- Não meu amor. Você não vai morrer não. O dodói daquela nenezinha era um dodói enorme. O seu é pequeninho.

Aqui caiu a ficha da criança. Não morremos só de velho! Com essas descobertas desandou a perguntar o paradeiro de alguns parentes que ele sabia, ou pelo menos intuía, que já haviam morrido:

- Onde esta aquela tia que tinha uma gata?

- Morreu. Disse a vovó.

- E a sua mãe vovó?

- Morreu também.

- E a mãe do vovô?

- Também já morreu.

- E o pai do Romeu, nosso cachorrinho?

- Esse também morreu.

- E você vovó, vai morrer também?

- Sim meu querido. Um dia morrerei. Mas não fique assim tão aflito, isso vai demorar muito tempo.

Passados uns instantes ele lançou o grande desafio:

- Mas vovó, você precisa mesmo morrer vovó?

Pablito levantava uma complexa questão transcendental: Diante da inexorável morte, o que podemos fazer para herdar a vida eterna?

Fico aqui pensando como nós humanos nos preocupamos com aquilo que sequer podemos evitar. Para quê preocuparmo-nos com a morte? A vida tem tantos problemas que temos de resolver primeiro, disse Confúcio.

É verdade que um dia morreremos. Mas morremos um dia só, nos outros todos nós vivemos. Quanto de vida há numa fração de minuto? Mil beijos eu te darei, meu netinho, se encostares teu rosto ao meu um só segundo.

E tua gargalhada de criança arrancada pelo roçar da minha barba mal feita contra teu rostinho de menino nunca mais sairão das retinas dos meus olhos e nem se apagarão das lembranças de minh’alma. Ainda que eu vivesse um só minuto, desde sempre serei eu o avô mais feliz do mundo.

A você meu querido, um segredo vou contar. Há mais de mim em você do que você pode notar. Toda vez que sentires solidão, tristeza ou dificuldade, eu virei, de onde estiver, é só me chamar. Não precisa gritar alto, fazer gestos de invocação. Basta ficar em silêncio e eu ouvirei teu clamor pelas batidas do teu coração.

Lembre-se que temos a eternidade de todas as horas que nos restam e como disse Mario Quintana “tão bom morrer de amor! E continuar vivendo...”. Quando eu me for você ore por mim, quando chegar a tua hora eu te reencontrarei.

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

Pablito, onde está Deus?



PABLITO, onde está Deus?

MMendes


Domingo passado fui à missa com meu neto. Ele não parava quieto no banco. Escorrega, senta no chão, deita no colo. Sabem como é difícil para uma criança de três anos ficar quieta. Vendo toda aquela inquietação eu disse a ele:

- Sente-se no banco, feche os olhinhos, faça silêncio e converse com Deus.

Ele até que obedeceu, mas no dia seguinte, depois que o vovô viajou, ele surgiu com uma difícil pergunta para a vovó, que me repassou via whatsapp:

- Vovó, por que quando fecho os olhos não encontro Deus?

Se de um lado o evangelista João afirma que “ninguém jamais viu a Deus”, o filósofo inglês Roger Scruton lembra que não conseguimos ver sequer nosso próprio rosto, senão por meio de um reflexo. Minha dificuldade era justamente tentar falar sobre “o rosto de Deus” para meu neto. Scruton me arrumou uma saída ao dizer que “o rosto de Deus” é revelado no reflexo da inter-relação virtuosa entre os homens e dos homens com a natureza. Lembrei-me de Jesus quando afirma “Quem me vê a mim vê o Pai”. Jesus era o reflexo humano da santidade de Deus.

O questionamento de meu neto me fez compreender que eu poderia sim mostrar o “rosto de Deus”, sendo reflexo do amor de Deus. Como afirmou o escritor Clive Staples Lewis “não pode refletir-se a luz do sol num espelho coberto de pó com a mesma luminosidade com que se reflete num espelho limpo”. Pensando nisso, antes de dar uma resposta a meu neto, no silêncio no quarto do hotel confessei a Deus meus pecados, suplicando que tornasse minha alma limpa e pura.

Ontem quando cheguei de Dourados meu neto veio correndo e pulou pendurando-se em meu pescoço:

- Vovô eu te amo.

Como é bom chegar de viagem e receber um “eu te amo” tão puro e verdadeiro. Foi Deus quem me presenteou, pois Deus é a fonte de todo amor.

A noite ele quis dormir em minha cama. Apaguei a luz e o abracei. Abraçadinhos perguntei:

- Você está me vendo?

- Não vovô, está muito escuro! Então continuei:

- É assim que acontece quando fechamos os olhos. Não vemos Deus, mas ele está ali abraçando a gente.

Passado uns minutos ele dormiu um sono profundo. Então sussurrei uma oração em seu ouvido:

- Durma bem meu anjinho e rasgue o véu da escuridão para entrar no santuário dos sonhos. Sonhe com Deus.