segunda-feira, 11 de outubro de 2010

O violão

O VIOLÃO
* Por MMendes



Os dedos deslizavam sobre os trastes em arpejos elegantes. Retiravam das seis cordas centenas de sons, capazes de cravejar a alma de notas musicais. Manejavam os ouvidos. Conduziam o pensamento a coloridas dimensões sonoras. A luz focava as mãos, mas as cordas é que encantavam. A melodia parecia hipnotizar o instrumentista que só tinha olhos para o instrumento. Com seu olhar vidrado e trejeitos frenéticos, alternava expressões de gozo e de dor, como se o instrumento o possuísse.

A platéia assistia aquele encantamento, também encantada. Não havia outro som além do violão. Sentado no banquinho sob a forte luz, o artista coloria o palco. A penumbra cobria os expectadores como um véu de noite. Apenas a luz do palco reluzia nos olhos das pessoas. A música que parecia encantar os movimentos do artista paralisava a platéia. Curiosamente quando o artista cessou seu frenesi a platéia é que entrou em delírio:

- Bravo! Bravo! – repetiam batendo palmas sem cessar.

A música orquestrava todos os movimentos. Platéia e artista. Ela ditava a cadência daquele teatro. Na verdade a música era a alma daquele lugar. O artista em pé, apoiava o violão no chão. A cada movimento de reverência do artista o violão parecia igualmente cumprimentar a platéia.

O concerto chegou ao fim. O violão mudo devolvia autonomia ao artista. Sem a vibração das cordas parecia inofensivo. Ficou nos braços do concertista apenas fazendo companhia. As pessoas não. Saíram complemente encantadas. As pessoas levaram consigo a voz do violão. A música permanecia viva na lembrança. Melhor do que isso, aquela música misturava-se permanentemente às memórias de todos.

O concerto remodelou o ser. A música remexeu sentimentos e reorganizou idéias. Quando saíram do concerto, as pessoas se reuniram em bares e restaurantes e comemoraram a vida. O violão trancafiado em seu estojo permanecia calado. O instrumento encantador de almas era agora prisioneiro. O artista estava saciado por ora, até que, necessitasse de outra overdose de acordes.

Aquele frágil instrumento encordoado guardava muitos segredos. Músicas esquecidas, de sucesso, as que nunca serão ouvidas. Músicas inéditas esperando para serem descobertas pelos dedos do artista.

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