segunda-feira, 11 de outubro de 2010

O SENTIDO DA VIDA


O SENTIDO DA VIDA

*Por Marco Mendes

Dirigia sozinho meu carro distraído pela estrada. Depois de um tempo, próximo da cidade de Rio Brilhante, com o olhar perdido nas paralelas da rodovia, ele assoprou uma pergunta em meu ouvido direito:

- Você sabe qual é o sentido da vida?

- Ainda não. Respondi.

Refleti um instante. Afinal, quem conversava comigo? Não havia ninguém ali, o rádio estava desligado. Minha percepção aguçou-se de modo que nada escaparia aos meus sentidos. De repente tudo ficou mais colorido e as formas adquiriram muito mais plasticidade. Embora tudo estivesse em movimento, o tempo parecia quase parado. Olhei para o relógio de pulso, o ponteiro dos segundos se seguravam como querendo contemplar cada instante. Um silêncio calou fundo por instantes, anunciando o que estava para acontecer. Então ele continuou a me dizer:

- Pois então hoje eu vou te contar.

- O que você era ante de nascer?

- Nada! Disse eu.

- O que você vai ser depois que morrer? Prosseguiu.

- Pó! Contra argumentei.

- O que os passarinhos fazem?

Nessa pergunta ele me pegou desprevenido. Não sabia qual era a resposta. -Voavam? Gorjeavam? Sei lá?

- Passarinho faz passarinho! Ele próprio respondeu.

- O que os cachorrinhos fazem?

A pergunta parecia tola, mas sua voz era doce e suave me seduziu a entrar na brincadeira.

- Cachorrinho faz cachorrinho! Respondi aceitando a provocação.

- Muito bem! Eis ai o sentido da vida.

- Não entendi nada. Respondi perplexo e confuso. Aquela conversa parecia desconexa, um emaranhado de loucuras, como poderia estar ali o sentido da vida? Ah! Se eu soubesse o sentido da vida. Quem sabe poderia dar sentido à essa vida louca de compromissos sem fim, de sofreguidão, de esforço interminável, de desamor a brotar nas esquinas das ruas da cidade.

- Então eu vou lhe explicar. Prosseguiu meu acompanhante, como pai ensinando um bebê.

- Se você não era nada antes de nascer e será pó depois que morrer, deveria entender que “tu és pó e ao pó tornarás”. Proteger a própria vida é inútil, porque fatalmente morrerá. Assim a vida só tem sentido se for capaz de produzir vida. Vida que não gera vida nova se extingue como a chama da vela que chega ao fim. É preciso transmitir a chama da vida para que não se apague. E quão triste é a escuridão.

- “Crescei e multiplicai-vos”! Sentido da vida.

- Eu não estou falando apenas da multiplicação biológica da vida. Eu estou falando da vida em todos os sentidos.

- “Eu vim para que todos tenham vida e vida em abundância”. Sentido da vida. Ao nascermos assumimos o compromisso de sermos fecundos. Mas, só quem conhece o sentido da vida é que recebe o dom da vida, capaz de multiplicar a vida em tudo o que toca.

- Olhe para o futuro e veja a vida que ainda não brotou, as crianças que ainda não nasceram, as sementes que ainda não caíram, as árvores que ainda não cresceram. Olhe para frente, para o fim da estrada, é preciso assegurar o direito à vida das gerações futuras.

- A vida é a única coisa importante. A vida em si, não a sua vida, não a vida do outro, mas a vida enquanto chama que pulsa, enquanto luz que ilumina. O sentido da vida é fazer vida nova, pois a vida que não se multiplica não serve pra nada e está fadada a morte. “Aquele que tentar proteger a própria vida morrerá, mas aquele que der a vida pelo outro viverá eternamente”. Eis aqui o sentido da vida e o segredo da vida eterna.

Disse-me todas essas coisas e retirou-se. Deixou o silêncio e lágrimas em meu rosto. O quê ou quem era a voz? Seria minha própria consciência? De onde teriam saído maravilhosos ensinamentos? Como poderia ser eu o mestre e o aluno ao mesmo tempo?

Retomei os sentidos, ainda estava dirigindo meu carro. Não me lembro da estrada durante a conversa. Segui viagem enquanto repassava tudo aquilo como se não quisesse perder uma só gota daquela sabedoria, que caia sobre meu espírito como um orvalho refrescante sobre o solo seco e castigado.

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